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Angela Borba
que se rasgou. Elisa a vê e a imita, sentando-se atrás dela.
Clara vê as duas e senta-se à frente delas. Faz um gesto
de dirigir com as mãos, como se estivesse segurando um
volante e movimenta as mãos para um lado e para o ou-
tro, imitando o som do carro com a voz e movimentos da
boca (Observações de campo, Creche UFF, 13 out. 2011).
A situação descrita mostra o início da atividade de imagina-
ção na criança pequena. Clara (2 anos e 6 meses) transforma
o objeto, o cubo vazado, dando-lhe outro significado, provavel-
mente o de um carro. Isso é possível através de uma forma especí-
fica de comunicação, na qual recorre a gestos e sons, aprendidos
nas interações com os adultos e outras crianças, em brincadeiras
ou narrativas envolvendo a ação de dirigir. A criança se des-
prendeu da situação imediata, introduzindo um novo elemento,
o volante, que se materializou apenas com os gestos, sem apoio
de outro objeto qualquer.
O mesmo brinquedo, em outra situação e combinado com di-
versos outros elementos, transformou-se em uma nave espacial,
onde foram tecidas complexas relações entre os seus tripulantes,
meninos e meninas em torno de 5 e 6 anos, que estavam fazendo
“uma viagem a Marte”.
A imaginação, quando emerge na vida da criança, é um as-
pecto novo, que não estava presente antes, representando uma
forma especificamente humana de consciência. De acordo com
Vigotski (2008), é uma função extremamente importante no de-
senvolvimento, por meio da qual
[…] a criança aprende a agir em função do que tem em
mente, ou seja, do que está pensando, mas não está visí-
vel, apoiando-se nas tendências e nos motivos internos, e
não nos motivos e impulsos provenientes das coisas (p. 29).